quarta-feira, 28 de junho de 2017

SEMINÁRIO SOBRE O SISTEMA DE PROTECÇÃO BASEADA NA QUALIDADE E ORIGEM DOS PRODUTOS

Teve lugar na cidade de Maputo, entre os dias 8 e 9 de Junho corrente o seminário subordinado ao tema supramencionado. O mesmo foi organizado pelo Instituto da Propriedade Industrial em colaboração com a OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) e tinha como objectivo sensibilizar os produtores nacionais, em particular, e a sociedade, em geral, sobre os benefícios do uso estratégico do Sistema de Indicações Geográficas e das Denominações de Origem. Esta foi, igualmente, uma oportunidade para a divulgação do potencial comercial de alguns produtos nacionais, através da potenciação da qualidade dos produtos como consequência da sua origem geográfica.

A Baipa foi representada no evento pelas suas colaboradoras Igma Nhaca e Cláudia Mabone.
Cláudia, Florence Rojal (Jurista Sénior da OMPI) e Igma.

Com Denis Sautier (CIRAD - Pesquisa Agrícola Para o Desenvolvimento)

sexta-feira, 2 de junho de 2017

O CANCELAMENTO DO REGISTO DE MARCAS EM MOÇAMBIQUE

Várias têm sido as solicitações que temos recebido sobre o cancelamento de marcas em Moçambique. Tais solicitações radicam de, entre outros, duas situações na quais os proprietários de marcas se vêm, amiúde, envolvidos. Primeiro, nos casos em que a sua marca foi registada por outrem e, em devido tempo, não foi apresentada a devida oposição e, segundo, nos casos em que um cliente pretende registar uma marca já titulada por um terceiro que dela não faz uso. Assim, julgamos importante clarificar a disciplina jurídica do cancelamento de marcas no país.

Cancelamento pelo não uso
São frequentes e cada vez mais insistentes as questões relativas ao cancelamento pela não utilização da marca. Entretanto, importa clarificar que o não uso não é um fundamento legal para requerer o cancelamento de uma marca em Moçambique. Parte considerável do equívoco nesta questão tem as suas raízes no primeiro código da propriedade industrial do país. Com o efeito, o Decreto nº 18/1999, de 4 de Maio, que aprovava aquele código prescrevia no seu artigo 109, nº 3, que "o cancelamento pode ainda ser fundamentado na não utilização da marca por um período ininterrupto  de pelo menos  três anos". O nº 4 do mesmo artigo aditava um esclarecimento sobre as circunstâncias nais quais o não uso não deveria ser invocado ("será, no entanto, indeferido o pedido de cancelamento nos casos em que se prove que a não utilização não foi intencional nem devida a nenhum acto exclusivamente imputável ao titular da marca").
Esta norma vigorou até ao ano de 2006, vindo a ser revogada com a entrada em vigor do código aprovado pelo Decreto nº 4/2006, de 12 de Abril. Este código abandonou o cancelamento pelo não uso da marca, acontecendo o mesmo com o novo código aprovado pelo Decreto nº 47/2015, de 31 de Dezembro. Por conseguinte, actulmente não é possivel solicitar o cancelamento de um registo de marca por causa do não uso. Todavia, o cancelamento pode ser requerido nos casos em que o titular do registo não depositou junto do Instituto da Propriedade Industrial (IPI) a devida Declaração de Intenção de Uso (DIU).
Esta matéria é regulada pelos artigos 138 (para os registos nacionais) e 162 (para os registos internacionais). Em relação aos registos nacionais, o nº 1 do artigo 138 estabelece que a DIU deve ser apresentada ao IPI de cinco em cinco anos a contar da data do registo ou de renovação. Sobre os efeitos da não apresentação da DIU, o nº 3 do mesmo artigo é suficientemente claro: "as marcas para as quais essa declaração não tiver sido apresentada não são oponíveis a terceiros, sendo declarada a caducidade do respectivo registo pelo Director Geral a requerimento de qualquer interessado, ou quando se verifique prejuízo de direitos de terceiros no momento da concessão de outros registos". No que diz respeito aos registos internacionais, o nº 2 do artigo 162 prescreve que a DIU é devida de cinco em cinco anos a contar da data do registo internacional. O nº 3 do mesmo artigo clarifica que a data do registo internacional é a data da inscrição do pedido de registo internacional na secretaria da WIPO. Sobre os prazos para apresentar a DIU referente aos registos internacionais, o Director Geral do IPI publicou um aviso nos boletins da propriedade industrial nºs 92, 93, 94 e 95, através do qual esclarece que "com vista a garantir a uniformização das diferentes datas das marcas internacionais, o IPI torna público que tomará como data de base para a contagem do prazo de apresentação de DIU’s de marcas internacionais, a data da notificação do pedido de registo a Moçambique (“date de notification”/”date of notification”)". Em relação a esta matéria, nós somos de opinião que deve prevalecer a norma inserta no código, pois este foi aprovado por uma Lei (no caso, Decreto nº 47/2015, de 31 de Dezembro) e ela não deve ser alterada com base em um simples aviso do DG do IPI. Por remissão do artigo 162, é aplicável aos registos internacionais a disposição aplicável aos registos nacionais sobre os efeitos da não apresentação da DIU, como acima descritos.
Portanto, o cancelamento pode ser solicitando com o fundamento da não apresentação da DIU e não pelo não uso da marca.
O procedimento
O interessado no cancelamento de uma marca deve conduzir uma pesquisa formal do estágio da marca para aferir/ confirmar se a DIU foi depositada ou não. Após a recepção dos resultados confirmando a falta da DIU, deve, então, submeter o requerimento de cancelamento anexando os resultados da pesquisa (é obrigatória a apresentação deste documento comprovativo). O DG do IPI decide em conformidade (regra geral em cerca de trinta dias), notifica as partes interessadas e manda publicar a decisão no boletim da propriedade industrial.

Cancelamento pela via judicial
O código oferece duas opções para o cancelamento pela via judicial. Elas tomam a forma de recurso contencioso, que são governados pela Lei que Regula os Processos de Jurisdição Administrativa, Lei nº 7/2014, de 28 de fevereiro. No seu artigo 3, alínea d), ela estabelece que a jurisdição administrativa tem por objecto dirimir os conflitos entre interesses públicos e privados. Eis as opções:
a)      Anulabilidade
Nos casos em que o IPI decidiu pelo registo de uma marca e há uma terceira parte interessada e que não concorda com tal registo, o código oferece a possibilidade desse interessado requerer junto do tribunal a anulação do registo em causa. A anulabilidade deve ser requerida ao Tribunal Administrativo, pois este é que tem a competência para conhecer e apreciar os actos praticados pelos órgãos do Estado (no caso o IPI), e que recaem sobre os direitos e interesses dos particulares, como prevê a Lei do Procedimento Administrativo, Lei nº 14/2011, de 10 de Agosto.
A anulabilidade deve ser requerida no prazo de noventa dias a contar da data da publicação do despacho de concessão no boletim da propriedade industrial. Tem legitimidade para requerer a anulabilidade aquele que provar que a marca lhe pertence ou por aquele cujo direito fundado em prioridade, tenha sido preterido no acto da concessão da marca, como estabelece o artigo 24 do código.

b)     Nulidade
A declaração de nulidade deve ser requerida, igualmente, ao Tribunal Administrativo e pode ser requerida a todo o tempo, como prescreve o artigo 25 do código. O fundamento legal para requerer a declaração de nulidade tem a ver, essencialmente, com o incumprimento de algumas formalidades na concessão de uma marca. Assim, a nulidade pode ter origem no facto do produto ou serviço a ser assinalado pela marca ser insusceptível de protecção; no facto de terem sido violadas as regras de segurança, ordem e saúde públicas; no facto da marca registada constituír uma ofensa à moral e aos usos e bons costumes; no facto da concessão da marca não ter obedicido a uma formalidade imprescendivel do processo de registo.

O procedimento
A parte interessada deve submeter ao tribunal Administrativo a sua petição com a fundamentação e provas de que é titular do direito da marca e/ ou que tem um fundado interesse na marca em causa. O tribunal notifica ao DG do IPI para responder no prazo de vinte dias, nos termos do artigo 64, da Lei que regula os processos de jurisdicao administrativa, Lei nº 7/2014, de 28 de fevereiro. Uma vez junta a resposta do DG do IPI, o tribunal cita a parte contra-interessada (aquele a quem o provimento do recurso possa afectar directamente) para contestar no prazo de vinte dias. Em caso de necessidade, o tribunal pode notificar a todas as partes envolvidas para juntarem alegações facultativas.
Munido do manancial de informação e provas facultadas pelas partes envolvidas, o tribunal decide em conformidade. A decisao é final e dela não cabe recurso.
Importa mencionar que o processo de cancelamento judicial da marca é bastante moroso e longo. A experiência mostra que há casos que aguardam pelo desfecho há mais de dez anos!! Como facilmente se percebe, esta demora é prejudicial aos interesses das partes envolvidas, que ficam anos a fio sem poderem realizar os seus negócios por não saberem da sorte que recairá sobre as suas marcas. Ou seja, a lentidão do tribunal em decidir sobre os processos resulta numa clara insegurança jurídica, o que afecta sobremaneira os negócios das partes envolvidas.

Conclusão
Como ficou acima demonstrado, o pocesso de cancelamento do registo de marca não é de todo linear e de fácil execução. Por isso, é recomendável que todo aquele com interesse no registo de marcas em Moçambique tenha um eficiente e eficaz "watching service" para fácil e atempadamente detectar potenciais casos de violação dos seus direitos de propriedade industrial, in casu, das suas marcas, e assim poder agir em tempo útil e oportuno, apresentando a competente oposição aos pedidos de registo de marca em causa. Para o efeito, importa notar que todos os pedidos de registo são publicados no boletim da propriedade industrial, correndo a partir da data da publicação, o prazo de trinta dias (prorrogável por mais sessenta dias) para apresentar a oposição. Quer dizer, melhor do que requerer o cancelamento de um registo de marca, é jogar na antecipação, evitando que quaisquer marca ofensiva chegue a ser registada, sequer.

Os processos de oposição e o do pedido de cancelamento for falta de DIU têm a vantagem de serem analisados e decidos por técnicos com conhecimentos sólidos em matéria de propriedade industrial, ao contrário dos processos de cancelamento por via judicial, que são analisados e decidos por pessoas sem o exigível preparo na matéria, com todos os riscos que daí podem advir.

THE CANCELLATION OF TRADEMARK REGISTRATIONS IN MOZAMBIQUE

O meu artigo sobre o cancelamento do registo de marcas em Moçambique foi publicado na Trademark Lawyer Magazine. Ler mais em http://edition.pagesuite-professional.co.uk//launch.aspx?pbid=8f450367-5863-4898-9c66-eb82480402b1&pnum=97


PASSANDO EM REVISTA ALGUNS MOMENTOS DA REUNIÃO DA INTA

A Acreditação





A Frequência


A Cerimónia de Abertura

Íñigo Méndez de Vigo (Minister of Education, Culture and Sport and government spokesperson, Spain)
Joe Ferretti (INTA President)

A Sessão Sobre África


A Recepção Africana


Joe Ferretti, Presidente da INTA

A Exposição


A Fila Para O Taxi


segunda-feira, 15 de maio de 2017

INTA ANNUAL MEETING 2017

Braz & Associados, Lda will be attending International Trademark Association (INTA) 139th Annual 
Meeting, in Barcelona, Spain, May 20-24.

UMA PATENTE INTRIGANTE

Vez e outra o IPI, ou para sermos mais concretos, os seus examinadores tomam decisões de cariz duvidoso. Umas vezes porque recusam o que não deviam recusar, outras porque admitem a registo pedidos que nunca deveriam lá chegar. Um desses casos é a concessão de uma patente, no mínimo, duvidosa. Trata-se da patente “Processo de Produção de Farinha Na Base de Banana Verde”, que ostenta o número 470/2016A.
O seu pedido de registo foi depositado a 15 de Agosto de 2016 pela Finana – Fábrica de Processamento de Farinha, E.I.. O pedido foi publicado no boletim da propriedade industrial (de ora em diante BPI) nº 91, de 15 de Novembro de 2016.
Quando nos deparamos com a publicação deste pedido conjecturamos para nós mesmos que se tratava de um processo fadado ao fracasso porque, em nosso entender, não reunia os requisitos para o seu registo. A 15 de Janeiro de 2017 foi publicado o BPI nº 93 que, entre outros, trazia os resultados do exame substantivo a que foram submetidos os pedidos publicados no boletim 91.
Inicialmente, ficamos surpresos. A seguir, perplexos. Depois, chocados. Finalmente, incrédulos. Estava escarrapachado nas páginas do boletim que o IPI, ou melhor, os seus examinadores, haviam concedido o título da patente “Processo de Produção de Farinha Na Base de Banana Verde”.
Vejamos, então, a seguir as razões da nossa inquietação e se, de algum modo, têm razão de ser.

O conceito
De acordo com o artigo 1, alínea o), do Código da Propriedade Industrial (daqui em diante CPI)
Uma “patente de invenção é o título concedido por uma autoridade administrativa competente para a protecção de uma invenção”. Ou ainda, nas palavras de Denis Barbosa (2003: pág. 295), "uma patente, na sua formulação clássica, é um direito, conferido pelo Estado, que dá ao seu titular a exclusividade da exploração de uma tecnologia"[1]. O essencial a reter é que a patente é um documento que assegura a protecção de uma invenção. No caso da patente em análise, facilmente se percebe que não se trata de nenhuma invenção pois “farinha de banana verde” é um alimento comum, vulgar e muito conhecido pela população moçambicana, nomeadamente pelas pessoas da província da Manica. É, também, muito conhecido pelo mundo fora. O seu processo de fabricaçã é igualmente sobejamente conhecido.
Uma consulta no motor de busca Google do nome “farinha de banana verde” revela a existência de novecentos e setenta mil (970 000) resultados com informação sobre o assunto. Estes resultados demonstram o grau de popularidade do produto em causa a nível mundial.
Do conceito acima retira-se, igualmente, o entendimento de que com a patente protege-se uma invenção humana que gera uma solução técnica. Ora, o sumário da "invenção" publicado junto com o respectivo pedido de registo da patente não revela nada de invenção e muito menos do problema técnico que o inventor procura resolver. Com efeito, o resumo descreve apenas a existência de boas condições para a produção da banana na Província de Manica e a prevalência de insegurança alimentar durante algumas épocas do ano. Reproduzimos na íntegra o resumo em causa:
"A banana é uma fruta tropical com grande valor de exportação e consumida no mundo por todas as idades e estratos sociais. Ela é rica em potássio, carbohidratos, vitaminas A, B e C, sais minerais, amido resistente que ajudam consideravelmente para promover boa saúde.Na província de Manica, especialmente no distrito de Gondola a banana está disponível durante todo o ano e normalmente é consumido como fruta, algumas famílias cozinham e outras destilam para fazer aguardente e não é processada como farinha, apenas em casos de extrema fome. Sabe-se que no mesmo distrito de Novembro a Fevereiro é considerado tempo de fome.O estudo mostrou que é possível produzir farinha de banana que pode substituir parcialmente a farinha de milho para fazer xima e ou papa para cobrir os meses de insegurança alimentar e reduzir a desnutrição em crianças. No entanto, tem-se notado que a produção de farinha de banana em Manica não existe, sendo assim, o processamento de farinha de banana é uma oportunidade de negócio. Mas parece que os empresários locais não sabem que a banana é matéria-prima que pode ser usada para produzir farinha e outros produtos que podem ser usados para iniciar um novo negócio na indústria de transformação".
Como se pode constatar, nem sequer o tal processo de fabrico da farinha de banana verde é descrito.

Quanto aos requisitos de patenteabilidade
O artigo 32 do CPI prescreve como requisitos da patenteabilidade a novidade, o envolvimento de uma actividade inventiva e a susceptibilidade da aplicação industrial da invenção. Esquadrinhando cada um dos requisitos temos:

Novidade
À luz do artigo 33 do CPI “uma invenção é considerada nova se não houver anterioridade no estado da técnica”. Quer dizer, a invenção é nova se não tiver sido divulgado nada a respeito do quer em Moçambique, quer em qualquer parte do mundo, antes da data do depósito do pedido de registo da patente.
Como já fizemos referência, o motor de busca Google revela a existência de bastante informação publicada sobre a farinha de banana verde. A título de exemplo, reproduzimos informação disponível em http://www.tuasaude.com/farinha-de-banana-verde:
Como fazer a farinha de banana verde
Para fazer a farinha de banana verde em casa basta seguir a receita:
Ingredientes
6 bananas verdes
Modo de preparo
Cortar as bananas em rodelas médias, colocar lado a lado em uma forma e levar ao forno em temperatura baixa, para não queimá-la. Deixar até elas ficarem bem secas, praticamente esfarinhando na mão. Retirar do forno e deixar esfriar na temperatura ambiente. Depois de totalmente frias, colocar as rodelas no liquidificador e bater bem até virar uma farinha. Peneirar até a farinha ficar na espessura desejada e guarde num recipiente bem seco e tampe.
Esta farinha de banana verde caseira dura até 20 dias e não contém glúten.
Como usar
A quantidade de farinha de banana verde que se deve consumir por dia é de até 30 gramas. Você pode adicionar até 2 colheres (de sopa = 20g) num copo de água e tomar em jejum ou adicionar no iogurte, na fruta, na vitamina de frutas ou no feijão, por exemplo.
Ela não tem um sabor forte e também pode ser usada para substituir a farinha de trigo no preparo de bolos, muffins, biscoitos e panquecas.
Resulta líquido do acima exposto que a “invenção” em causa não é nova pois houve anterioridade no estado da técnica. Como explica Carla Barros (2007: pág. 195) "uma das características da novidade exigida é a extraterritorialidade (…). A característica em menção destaca-se importante em vista de sua amplitude, uma vez que suficiente uma publicação em periódicos ou sustentação oral em congressos de notícia técnico-científica, em qualquer país para que se tenha a novidade comprometida, caracterizando-se, destarte, a anterioridade, cabe falar-se, por conseguinte, em princípio da novidade absoluta”[2].

Actividade Inventida
Nos termos do artigo 35 do CPI, “uma invenção é considerada como implicando uma actividade inventiva se, para·o técnico competente na matéria, a invenção não resultar de uma maneira evidente, do estado da técnica”. Ora, no caso sub Júdice facilmente se percebe que não apenas para o técnico competente na matéria, como para qualquer pessoa, a produção de farinha de banana verde é uma questão óbvia, evidente. Ou seja, não envolve nenhuma actividade inventiva.
  
 Aplicação Industrial
Uma invenção é considerada como susceptível de aplicação industrial se o seu objecto puder ser fabricado ou utilizado em qualquer género de indústria”. É o que estabelece o artigo 36 do CPI.
De acordo com Denis Barbosa (2003: págs. 333-4) este requisito envolve dois elementos importantes. O primeiro, que "a indústria seja daquelas cujo resultado importe em mudança dos estados da natureza. Assim, o teste é de se o problema técnico solucionado presuma tornar objetos mais pesados ou mais leves, ácidos ou básicos, estáveis ou explosivos". O segundo elemento, que a aplicação industrial signifique “relativo à mudança nos estados da natureza”, por oposição às simples operações conceituais, aritméticas, artísticas ou, em geral, abstratas"[3].
Como temos vindo a dizer, a "invenção" ora em análise não resulta na alteração na solução de um problema técnico, ou seja, não há alteração do estado da natureza. Pelo contrário, trata-se apenas de um simples e vulgar método de produção de farinha de banana verde. A consolação é a de que, para além do fabrico caseiro, a farinha de banana verde pode ser produzida numa indústria.
Analisada a “invenção” Farinha de Banana Verde sob o crivo dos requisitos acima apresentados, chega-se a conclusão que ela não é uma invenção patenteável à luz do CPI, pelo que os examinadores deveriam acionar o disposto no artigo 72, a), do CPI que prescreve que a falta de um dos requisitos indicados no artigo 32 constitui fundamento de recusa do pedido de registo de patente. Por motivos que não são facilmente entendíveis os examinadores fizeram tábua raza do dispositivo legal acima mencionado.

Ademais, segundo o artigo 39 do CPI, “o direito à patente pertence ao inventor ou aos seus sucessores, por qualquer título”. Sucede que no caso da “patente” que temos vindo a analisar não há indicação de quem seja o inventor, a publicação no boletim é omissa quanto a esse aspecto. A publicação faz menção do requerente, Finana – Fábrica de Processamento de Farinha, E.I., mas estranhamente não indica o inventor, o que não é normal.
Outrossim, uma vez concedida, o titular da patente tem o direito de uso exclusivo da mesma. A exploração comercial da patente pode ser feita a título individual ou pela venda ou cessão a instituições com pujança para o efeito. O titular tem, também, o direito de agir contra terceiros que usem a sua invenção sem o seu consentimento expresso. Aqui chegados, importa fazer o seguinte questionamento: com que legitimidade o provável inventor desta “patente” vai impedir que as pessoas deixem de produzir o que já é feito há centenas de anos no país e em todo o mundo?

Em conclusão, podemos dizer que estamos perante uma péssima decisão do IPI e dos seus examinadores, porque "Processo de Produção de Farinha Na Base de Banana Verde" não é uma patente, de acordo com os critérios previstos no CPI e acima escalpelizados. Por conseguinte, ela pode ser anulada a qualquer momento, como estabelece o artigo 25 do CPI, pois o seu objecto é insusceptível de protecção e, na respectiva concessão, não foram seguidos à risca os procedimentos ou formalidades imprescindíveis para a concessão do direito, nomeadamente as exigências do exame substantivo do pedido de registo para apurar se estavam preenchidos os requisitos de patenteabilidade.




[1] Barbosa, Denis Borges (2003) Uma Introdução À Propriedade Intelectual, Segunda Edição Revista e Atualizada, Lumen Juris, Rio de Janeiro.
[2] Barros, Carla Eugénia Caldas (2007), Manual de Direito da Propriedade Intelectual, Editora Evocati, Aracaju.
[3] Barbosa; Denis Borges (2003). Idem.

terça-feira, 2 de maio de 2017

INAE E OS DIREITOS DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL

Introdução
Fixe-se o momento que marca o ponto de viragem na actuação da INAE. A 18 de Julho de 2016 o Governo procedeu a uma remodelação na direcção desta instituição, exonerando o então Inspector Nacional, José Rodolfo, e nomeando para o seu lugar Maria Rita e, pela primeira vez, um Inspector Nacional Adjunto, no caso Acácio Foia. De imediato, a acção da instituição transfigurou-se. De uma pálida actuação, só publicamente notável nas épocas da quadra festiva de Dezembro para a fiscalização dos preços e validade dos produtos comercializados, passou a ser uma presença constante nos meios de comunicação social e nas redes sociais, graças à sua actuação contundente e implacável. Os efeitos fizeram-se sentir primeiro, no sector da panificação, a seguir, no da restauração e, mais recentemente, no das fábricas de bebidas.
No último caso, a 5 de Abril do corrente ano foi anunciado que a INAE apreendeu na CDM cerca de 46 mil caixas para acondicionar garrafas de cerveja, por violação dos direitos de propriedade de terceiros. Mas antes de analisarmos este procedimento, importa esclarecer, à quem possa interessar, o que é a INAE.
INAE é o acrónimo de Inpecção Nacional das Actividades Económicas. Foi criada pelo Decreto nº 46/2009, de 19 de Agosto. Trata-se de uma "instituição pública de âmbito nacional e é tutela pelo Ministro que superintende as áreas da Indústria e Comércio", como estabelece o artigo 3º do decreto em causa. Tem como objectivo a fiscalização das actividades económicas no pais. As suas atribuições encontram-se estabelecidas no artigo 4º do decreto acima mencionado, de entre as quais avultam a fiscalização de todos os locais onde se exerce qualquer actividade industrial, comercial ou de prestação de serviços; a promoção de acções de natureza preventiva em matéria de infracções contra a qualidade, genuinidade, composição, aditivos alimentares e outras substâncias e de rotulagem dos géneros alimentícios para consumo humano e dos alimentos para animais.
No que diz respeito a propriedade industrial, que é aquilo que nos interessa neste momento, compete a INAE combater a produção e venda de produtos pirateados ou contrafeitos, como prescreve a alínea i) do artigo 4º do dispositivo legal acima referido.
Adicionalmente, o Código da Propriedade Industrial (de ora em diante CPI), aprovado pelo decreto nº 47/2015, de 31 de Dezembro, estabelece no seu artigo 222º, nº 1, que "compete a INAE, em articulação com o Instituto da Propriedade Industrial (doravante IPI), a averiguação das infracções contra os direitos de propriedade industrial". O artigo 223º esclarece que a averiguação das infracções pode ser por iniciativa do INAE, do IPI ou por denúncia dos interessados.

 Voltemos ao caso das caixas apreendidas.

O problema
Para acondicionar as suas garrafas, a CDM usa caixas fornecidas pela Arkay e, também, pela Topack, ambas empresas moçambicanas. Sucede que o desenho das caixas fornecidas pela Arkay é, segundo a INAE, uma cópia/ imitação do desenho das caixas concebido e fabricado pela Topack. Pelas informações tornadas públicas pelos meios de comunicacao social não fica claro de quem foi a iniciativa da averiguação da infracção, se do INAE, do IPI ou da empresa ofendida, no caso a Topack. Mas por agora isso é de somenos importância.
Importa esclarecer que em termos técnicos, o desenho em causa chama-se Desenho Industrial, e é uma das modalidades dos direitos de propriedade industrial. Com efeito, nos termos do artigo 1º, alínea d), "desenho industrial é qualquer conjunto de linhas, cores ou forma em três dimensões que dê um aspecto visual novo e original a um produto, ou parte do mesmo, e que possa servir de protótipo para a sua fabricação industrial ou artesanal".
Uma vez registado junto do IPI, o titular do desenho industrial tem o direito de uso exclusivo do mesmo e, por conseguinte, de impedir que terceiros o usem sem a sua expressa autorização, nos termos do artigo 119º do CPI.
                         
Das infracções
Ao fabricar e vender caixas para acondicionar garrafas usando o desenho industrial titulado pela Topack Moçambique - Indústria de Plásticos, Sarl (Desenho Industrial nº 48/2002 L, registado a 22 de Agosto de 2002) a Arkai violou os direitos de propriedade industrial daquela. Concretizando: a Arkay Plastics Mozambique, Lda incorreu na prática da concorrência desleal e na violação dos direitos exclusivos do desenho industrial, ambos previstos no artigo 212º, alíneas a) e c), do CPI.
Concorrência desleal é a prática de actos contrários aos bons usos e costumes da actividade industrial, comercial ou de serviços. No caso sub judice, a concorrência desleal consubstanciou-se nas acções previstas nos artigos c) e f) do artigo 213 do CPI:
ü  "praticar actos susceptíveis de criar confusão, de qualquer modo, com o estabelecimento, produtos, serviços ou actividades industriais ou comerciais de um concorrente";
ü  "induzir o publico em erro sobre a natureza, a qualidade, o modo de fabrico, as características e a utilização dos produtos e serviços no exercício da actividade comercial" -
Outrossim, a Arkai violou os direitos do desenho industrial da Topack ao praticar as seguintes acções previstas nas alíneas a) e b) do artigo 215º do CPI:
ü  "Utilizar, reproduzir ou imitar, total ou parcialmente, desenhos industriais sem a autorização do respectivo titular";
ü  "Colocar a venda ou em circulação um desenho industrial registado, sem o consentimento do respectivo titular".
Ora, ao colocar a venda produtos acondicionados em caixas que violam o desenho industrial de terceiros, a CDM colocou-se, também, na posição de infractor nos mesmos moldes que a sua fornecedora Arkai. Por conseguinte, ela incorreu, de igual modo, nas infracções acima descritas e deve ser sancionada em conformidade.

Caixas usadas pela CDM. Imagem retirada de https://www.google.co.mz/

 Da punição
Quanto aos infractores, a INAE anunciou que vai punir a CDM com uma multa equivalente a 112 salários mínimos. Sobre esta punição é preciso deixar ficar o seguinte reparo. O anúncio publico da INAE é omisso quanto a Arkai. Na nossa modesta opinião, ela deveria ser sancionada pois ela incorre nas infracções contra os direitos de propriedade industrial acima mencionadas.
No que tange as sanções em si, a INAE vai punir o infractor apenas pela violação dos direitos do desenho industrial, deixando passar a prática da concorrência desleal. É nosso entendimento que os infractores praticaram actos que consubstanciam a infracção de concorrência desleal, como ficou demonstrado acima. Ora, nos termos do nº 4 do artigo 213º do CPI, a concorrência desleal deve ser punida com a multa de 224 salários mínimos. Ou seja, cumulativamente, os infractores deveriam ser condenados a pagar a multa de 336 salários mínimos, cada, sendo 112 pela violação dos direitos do desenho industrial e 224 pela prática da concorrência desleal.

Conclusão
Com todas as imperfeições e mal entendidos acima pontuados, esta acção da INAE deve ser saudada porque por um lado, pune uma violação dos direitos de propriedade industrial, coisa rara no país e, por outro, serve de aviso a potenciais prevaricadores para se absterem da pratica de tais actos.

Entanto que profissionais da propriedade industrial, esperamos que a INAE tome medidas urgentes no sentido de resolver os casos que a ela foram submetidos para averiguar sobre casos de contrafaccao e outras infraccoes contra os direitos de propriedade industrial e que se encontram sem desfecho há bastante tempo. Esperamos, outrossim, que quando accionada sobre casos similares aja com a devida celeridade, para a salvaguarda dos interesses dos titulares dos direitos dos propriedade industrial, dos consumidores e da economia nacional.

IPI CELEBRA A 200ª EDIÇÃO DO BOLETIM DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

Com a publicação da edição de 15 de Dezembro, o Instituto da Propriedade Industrial alcança a marca histórica de 200 edições do seu Boletim ...